#10 - É como Lulu Santos dizia
Por que aprender não precisava ser um processo tão tortuoso pra quem não é rico
A beleza é mesmo tão fugaz. É uma ideia que existe na cabeça e não tem a menor pretensão de acontecer.
Me ausentei semana passada aqui na newsletter porque acabei atolado em ideias mais urgentes, alguns pedidos e me faltou tempo e clareza pra escrever algo. Mas aí, estive em Belo Horizonte no último fim de semana e me ocorreram algumas coisas meio transcendentais. Vou tentar organizar elas de uma maneira inteligível, sabendo que provavelmente vocês terminarão a leitura tão confusos quanto eu.
Nos últimos meses, tenho tentado encontrar o equilíbrio entre questões econômicas, pessoais e profissionais, e isso me fez mais mal do que bem. E nesses momentos em que me sinto como um siri na lata, costumo parar pra me reencontrar e pensar o que posso estar fazendo de errado. É essa a primeira hipótese, a premissa da qual parto: se algo não deu certo, provavelmente é porque não fui cuidadoso o suficiente com alguma parte do processo.
Ser artista por hobby tem suas mazelas: é praticamente impossível se manter financeiramente sem um emprego (isso eu já sabia, mas precisava tentar mesmo assim) e geralmente isso te faz ser engolido pela frustração dia após dia. Porque se manter não é apenas uma questão psicológica, é também de autonomia pra receber algo pelo que se faz e não ficar só no prejuízo. E quem não recebe nada ou muito pouco, dificilmente tem possibilidade de investir em melhorias. Ponto.
Vivemos num sistema capitalista no qual a sobrevivência está diretamente atrelada ao dinheiro e ao poder de compra. Sem isso, ficamos à margem de tudo. Vi algumas pessoas (e rapidamente percebi o status social delas) por aí na internet dizendo que não devemos tentar monetizar tudo o que fazemos, embora isso seja só mais um discurso de gente que tem a vida ganha tentando ensinar quem não está com a vida ganha a lidar com um impasse social e urgente, que é a má distribuição de renda.
Para quem não tem um mecenas (ou um papai incentivador) por trás para bancar iniciativas, um simples projeto gráfico demanda investimento. E todo investimento está sujeito a não ter retorno. Se eu acho que meu trabalho valeria uma participação no Shark Tank para tentar vender uma parte da minha empresa ao Semenzato ou ao Apolinário? Com certeza não acho. Mas já tive alguns indícios que me mostraram que determinadas aplicações dele podem ser lucrativas. E veja: não faço nada na vida pensando em ser milionário, apenas visando uma condição razoável. Talvez esse seja o problema, afinal.
Até aqui, em 2023, entreguei alguns álbuns, centenas de figurinhas, um bom número de pôsteres. Os álbuns são, até aqui, meu tiro mais certeiro na questão de aceitação pelo público e adesão, porque eu entendo bem o nicho de colecionadores (já deve ter ficado claro que sou compulsivo). As histórias em quadrinhos (Faz, Bebeto) não visam qualquer lucro por ora, são extremamente satisfatórias de produzir, e em breve recomeçarei o projeto com uma nova roupagem e narrativas mais autorais, pra publicar na Amazon e em sites de HQs.
Pensei, no meio de tudo isso, que uma loja com itens que levam minhas artes seriam uma boa forma de renda complementar. Mesmo encontrando soluções de fornecedores que não são caras e tampouco exigem taxas abusivas em cada venda, o negócio não andou. Primeiro porque as pessoas não tem obrigação alguma de comprar o que faço, e segundo porque, aparentemente, esse tipo de produto só tem tração com campanhas de divulgação. Não consigo bancar essa parte agora e vou fechar o barato na virada do mês na Montink, mantendo apenas a loja na Nuvemshop para vender os álbuns. E está tudo bem. Desistir de algo que não trouxe resultado não é exatamente uma desistência. Embora eu ache que precise de mais tempo pra difundir a ideia, financeiramente não dá pra ficar brincando de ser Poliana ou projetar retornos aceitáveis baseados em nada. Vou voltar a fazer o que faço melhor sem bancar o aventureiro. A loja na Montink ficará ativa até a próxima quinta-feira, para caso vocês queiram adquirir algo lá. Depois disso, zé fini.
Aprendi a lidar com a frustração de uma forma que eu tenha maior controle do que eu conheço e do que me deixa confortável e me dá uma ideia de desenvolvimento de potencial. Esse desenho do Firmino, acima, foi uma tentativa que fiz com novos pinceis, mais voltados pra caligrafia (!) e um efeito de luz que estou aprendendo a mexer aos poucos.
Tenho também me aventurado nos pontilhados que compõem a luz e as sombras das artes. Vocês podem olhar pro desenho que abre o post pra entenderem melhor do que se trata. Ou ver essa aqui, que fiz pra final da Liga Europa (ainda não divulguei oficialmente e devo fazer pequenas alterações):
A grande implicação capitalista pra produzir arte é: eventualmente, você começa a atrelar tudo a dinheiro. Quando eu fazia no tempo livre e conseguia uma graninha extra, era perfeito. Mas pensar em se desenvolver apenas porque você sente que merece reconhecimento e status é uma besteira muito grande, uma cilada que atrai a gente. Digo isso porque todo dia eu esbarro em lojistas que comercializam coisas relacionadas a arte com esforço mínimo.
Estampas preguiçosas, fotos roubadas com filtros, pôsteres “históricos” feitos em dez minutos, tudo isso te induz a pensar que se você caprichar, os clientes aparecem. Mas não tem muito a ver com isso. Minha percepção em relação a reconhecimento é muito mais puxada pro lado de afeto com a imagem do que necessariamente o quanto ela vende. Nem sempre o que eu considero como melhor e mais acabado é aquilo que as pessoas vão olhar e falar: porra, quero pendurar na parede, fazer uma caneca. E acredite, eu já tentei utilizar várias fórmulas batidas pra isso. Eu queria ganhar dinheiro com tudo isso? Com certeza, mas não ganhar não me tira a vontade de continuar fazendo e experimentando. A alegria que me dá, isso vai sem eu dizer. Isso é que é importante.
Mas afinal o que é satisfação? É a grana, o engajamento fora do normal ou como você se sente completo quando termina uma peça? Talvez haja um meio termo aí, pra que não haja aquela sensação de estar falando com as paredes. Me vejo muito mais como alguém prejudicado pelos algoritmos do que necessariamente ruim no que faço. Em menos de quatro anos, consegui entregar coisas inimagináveis em relação àquele dia que comprei uma mesinha da Wacom no shopping pra expandir meus horizontes. Não tenho como não pensar que estou no caminho certo se a recepção que tenho pelo trabalho como um todo é geralmente positiva. Isso me vale muito mais do que qualquer quantia em dinheiro. Pode ser que eu considere em alguns dias que é injusto quando a preguiça dos outros se sobressai ao esforço, mas há muito pouco o que se fazer a respeito.
E se amanhã não for nada disso, caberá só a mim esquecer. E eu vou sobreviver. O que eu ganho e o que eu perco, ninguém precisa saber…