#37 - viagem ao núcleo de si
é possível superar as próprias autossabotagens pra construir um caminho novo
Toda história com final feliz teve um inferno e um caminho acidentado antes da última página. Gosto de dizer isso não só como um calmante verbal, mas também como alguém que tem certeza que as coisas vão se acertar, embora sejam bastante tortuosas em determinados trechos.
Não sei se gosto muito de um tom motivacional, mas veja, é melhor estar motivado do que ser um desistente crônico. Não é de hoje a minha conclusão sobre ter errado feio na escolha da minha primeira profissão. E que isso me gerou anos de instabilidade, fragilidade financeira e óbvio: insegurança profissional.
Sempre achei que o espaço que se ocupa na mídia é para poucos com cacife e boas recomendações. E que eu comprei brigas inúteis demais ao longo da juventude que acabaram me fechando portas. No ano passado, na fase de maior introspecção que já vivi, precisei testar essa teoria. E, não fosse por falta de vagas, eu talvez estivesse completamente enganado.
Fato é que empregos e oportunidades não caem do céu. A gente precisa encher o saco, falar com pessoas, mandar currículos e acima de tudo, ter algo diferente para apresentar. Desde 2020 eu não gosto de me apresentar como jornalista, não só porque não tenho diploma apesar dos 13+ anos de experiência. Mas porque eu sequer sei o que é ser jornalista nos dias de hoje. Só enxergo a precarização, a competição por empregos e os apelos vexatórios por audiência. Não era bem isso que eu via quando entrei na faculdade e nem mesmo quando desisti dela, por não poder pagar mais mensalidades.
A vida é feita de escolhas e algumas escolhas precisam ser essencialmente corajosas. Até na burrice é exigido um pouco de coragem. E na minha visão, essa virtude não é só o inverso do medo. É também a necessidade de tornar o resultado de uma atitude em algo palpável, possível, alcançável.
Ideias que tive na hora errada, sacadas que eu poderia ter em um momento de desespero. Tudo isso vem à mente quando lembro que o mundo está praticamente todo aberto, mas não haverá nenhum convite para que se entre nele. Em determinadas situações, a gente precisa forçar a porta. Ou criar uma nova, na bicuda, na marretada.
O meu 2023 teve tudo. Figurinhas, quadrinhos, histórias estapafúrdias, bonecos brigando e explodindo, gangues praticando fraudes, mil mudanças de endereço e uma sensação de deslocamento tão profunda que eu precisei voltar ao coração da minha infância a fim de entender o que eu era, o que sou e o que pretendo ser. Como diziam os Racionais: quando os caminhos se confundem, é necessário voltar ao início. Nessa viagem sem data para retornar, eu descobri várias respostas. A principal delas era apostar mais naquilo que eu gosto de fazer, o que me dá mais prazer e perspectiva.
E então, invertendo a lógica que vivi nos últimos cinco anos, tratei o jornalismo como freela e a ocupação artística como prioridade. Não vou elaborar muito mais que isso, mas em uma das sessões de terapia que tive, o momento mais libertador foi quando comentei um par de acontecimentos ao terapeuta e ouvi a frase: “Então você conseguiu. Você se deu uma chance, você se contratou”. O pavor que eu tinha de ficar desempregado por mais tempo deu lugar a uma vontade urgente de me colocar de outra forma no mercado. De utilizar o que sei fazer melhor em um espaço onde há demanda.
Não foi um movimento repentino, claro. Foi um recomeço. Aí apareceu uma oferta de trabalho, depois o primeiro freela grande com ilustração. Posteriormente veio a capa do jornal, as páginas internas, e a presença em um especial que espero que fique no ar por muito tempo. Me permiti. Mas sabendo que era só um recomeço. Era pouco para me contentar. O que não impediu que novas ondas de insatisfação batessem nas minhas costas. E aí me perguntei: será possível que ninguém aproveita esse par de quadrinhos sobre esporte em nenhum lugar? Não pode ser.
Não podia mesmo. E eu só poderia saber a resposta pra isso se perguntasse para alguém do ramo. Vendesse a ideia. Colocasse um preço e um desejo na minha abordagem. Como pude notar, eu estava enganado. Há espaço, há interesse, há verba, há até uma proposta perfeita para casar com o conteúdo.
Eu confiei em mim, no meu trabalho. E o que ganhei em troca? O que eu mais desejava. Posso ser confuso, ansioso, afobado às vezes. Troco os pés pelas mãos porque tenho pressa e todos os dias eu tento melhorar. E eu me permito. Criar e praticar é sempre melhor do que ficar chutando pedrinhas na rua, amaldiçoando o tempo perdido e o tempo que ainda irá se perder. Só que o relógio anda pra frente, nunca pra trás, não importa o quanto a gente queira.
É só mais um recomeço. E pra quem esteve tão acostumado a perder, emplacar uma vitória atrás da outra vira uma chave na cabeça…
El Verdugo seria um projeto…
El Verdugo foi o selo que escolhi para seguir o legado deixado pela iniciativa da Faz, Bebeto, aquele quadrinho que vocês me viram publicar ano passado. Por gostar demais do projeto, resolvi dar outra chance. Planejava publicar uma coletânea ainda este ano, em caráter impresso e digital para Kindle. Mas não vai rolar…
…porque alguém resolveu comprar a maluquice pra ter nas suas redes sociais a partir de fevereiro. Por agora, não posso falar mais que isso. Só aquela frase lá que eu tanto gosto, do Lulu Santos: vamos viver tudo o que há pra viver, vamos nos permitir…